Publicado no “Jornal Bom Dia”, São Paulo, SP, Brasil, 24 de setembro de 2009.
O Brasil é um país com uma grande e longa tradição no instituto do asilo político e, portanto, no respeito aos direitos humanos e na prática da tolerância, virtude que o sábio Voltaire acertadamente apontava como o apanágio da Humanidade.
De fato, da Europa, recebemos os refugiados dos mais diversos países. De Portugal, recebemos os perseguidos de Salazar e, com o triunfo da Revolução dos Cravos, os próceres do salazarismo. Da Itália, recebemos os perseguidos de Mussolini, da Alemanha, perseguidos de Hitler. De Espanha, as vítimas do franquismo.
Da mesma forma, o Brasil recebeu do leste Europeu, perseguidos políticos de regimes diversos. Na América do Sul, durante décadas recebemos os refugiados de Stroessner e, quando de sua derrubada, o próprio, que viveu tranqüilamente até a morte em Brasília.
Do Líbano, recebemos tantos refugiados que nossa população de origem libanesa se tornou maior do que a daquele país.Com o passar dos anos, a herança humana dos refugiados aqui recebidos, e que se tornaram brasileiros, passou a compreender a nossa cultura, com os mesmos valores de que lançamos mão para conceder o asilo: o respeito à dignidade humana, à liberdade de pensamento, à liberdade de manifestação política, e à observância dos direitos humanos.
Assim, a causa da manutenção da política tradicional de concessão de asilo político pelo Brasil encontra-se hoje ameaçada pelo caso Cesare Battisti. A medida, que é de resto um ato de manifestação da soberania do Brasil, por meio do Poder Executivo, acha-se em risco por uma possível equivocada manifestação do Poder Judiciário, instigada por um governo estrangeiro com poucas credenciais democráticas.
Notoriamente um estado cliente dos EUA, a Itália é uma grande e sistemática violadora dos direitos humanos, recebendo críticas da ONU e da própria União Européia.
Vigilantes racistas, que evocam os chamados camisas negras de Mussolini, patrulham as ruas do norte do país, onde Garibaldi, que se refugiou no Brasil por uma sentença de morte em Genova, deixou de ser herói. O caso Cesare Battisti, dentre nós, tornou-se emblemático para a manutenção da causa dos direitos humanos e de nossa ordem constitucional.