Publicado no Portal Grabois, 04 de dezembro de 2024, Brasil.
Há sabidamente cerca de 40 milhões de brasileiros descendentes de italianos. O número
corresponde a cerca de 66% da população da República Italiana. Menos de 5% deles
detém a cidadania. É certo que muitos se desinteressam pelo exercício do direito, talvez
mesmo a maioria. Por outro lado, de maneira sistemática, durante o longo período de
150 anos, os sucessivos governos italianos têm cerceado, de maneira horizontal e através de barreiras artificiais, o exercício do direito à cidadania pelos descendentes de
imigrantes, assegurado através dos tempos por suas próprias legislações.
As medidas horizontais e barreiras artificiais referidas têm sido consistentemente
praticadas através dos tempos, no sentido da procrastinação e dificultação
reconhecimento da cidadania, mediante um inferno burocrático, bem como na falta de
estruturas consulares para dar atendimento à demanda. Note-se aqui que a cidade de
São Paulo tem mais descendentes de italianos que as populações combinadas de Roma e
Milão e mais descendentes de napolitanos do que a bela e admirável cidade de Nápoles.
Para atendê-los, há um reduzido contingente de diplomatas. Este triste quadro moroso,
problemático e árduo é também agravado pelo atendimento humilhante aos
peticionantes.
Estas enormes comunidades itálicas foram deliberadamente abandonadas pelos
sucessivos governos do país. Aqueles originários do sul da península foram inicialmente
tratados como nacionais de Estado inimigo, pois egressos devidos aos efeitos da guerra
civil da unificação. Nenhum dos imigrantes e descendentes teve acesso a iniciativa
culturais daqueles governos, inclusive no tocante ao aprendizado da língua italiana,
idioma que não existia quando seus ancestrais vieram para o Brasil, até o presente.
Não obstante, as comunidades itálicas do Brasil mantiveram, a duras penas, os vínculos
culturais com a terra de origem, expressos nos valores do trabalho, da religião, da
solidariedade proletária, do sindicalismo e através da música, da gastronomia e de
outras manifestações de ordem cultural. Os imigrantes promoveram a tolerância ao se
miscigenar com elementos de outras etnias, virtude que tem se feito algo escassa na
Itália, como constantemente lembrado pelo Papa Francisco. Muitos dos descendentes se
tornaram empreendedores de enorme sucesso, bem como profissionais e artistas
expressão internacional. Milhões se tornaram prósperos.
Atualmente, a indigna situação tende a se agravar com uma nova iniciativa legislativa
italiana, perversa, demagógica e obtusa, no sentido de oficializar e expand
substancialmente as limitações do acesso à cidadania italiana por brasileiros
descendentes, dentre outros, já aprovada pelo parlamento, controlado por forças
políticas de extrema direita. Projeta-se que esta draconiana lei entre em vigor em 2025.
Para complementar, os mesmos parlamentares decidiram ampliar as barreiras artificia
reduzindo os fundos consulares em 22 milhões de euros, o que irá prejudicar ainda mais
o já desastroso atendimento aos cidadãos residentes no exterior e aos peticionantes
potenciais.
DURVAL DE NORONHA GOYOS JR., Jurista, escritor, historiador e lexicógrafo. Autor
de Breve História da Imigração Italiana; de Dicionário de Aforismas Napolitanos em
napolitano, italiano, português e inglês; de A Campanha da FEB pela Libertação da Itália,
em português, italiano e inglês, pelo qual recebeu medalha da Presidência da República
do Brasil (Dilma Rousseff); bem como de 2 livros em italiano sobre investimentos no
Brasil. Escreve quinzenalmente neste espaço às quartas-feiras