O culto da ignorância

Publicado no jornal Diário da Região, São José do Rio Preto, SP, 29 de janeiro de 2025.

Donald Trump tomou posse como presidente dos EUA, no dia 20 de janeiro de 2025. Ele é
mais um produto do fascismo eterno, segundo o termo do professor e escritor Umberto
Eco, aplicável a um totalitarismo opaco e multiforme, tradicionalista, nacionalista e
imperialista. A doutrina é ainda elitista, desumana e inclemente. O termo diz respeito a
regimes opressores diversos, com as principais características básicas comuns entre eles.
Contudo, a formatação atual difere daquelas dos séculos 19 e 20, pelo desmedido poderio
militar atômico, econômico e nanceiro daquele Estado hegemônico.

Uma característica comum a todos estes regimes é o culto à ignorância. Segundo o
professor estadunidense, Isac Asimov, escrevendo em 1980, a tradição do Antiintelectualismo é uma tendência constante na vida política e cultural, alimentada da falácia de que a minha ignorância vale tanto quanto ao seu conhecimento. A dedicação da ignorância, contudo, aumentou através dos anos, expandindo-se por conta dos meios informáticos, através da mídia social. Umberto Eco denominou tal fenômeno de “invasão dos imbecis”. O culto do irracionalismo tem prosperado com a frustração da cidadania, alimentada pelos sosmas divulgados pelo mesmo meio.

Nem sempre foi assim. No passado, a ignorância teve uma péssima reputação. Os seus sinônimos, como analfabetismo, inconsciência, imperícia, incompetência etc., sempre tiveram uma conotação negativa. Por sua vez, os seus antônimos reetiam qualidades então admiradas, como o saber, a cultura, a ciência, a capacidade, a competência e a cortesia. Confúcio, aquele sábio extraordinário, ensinou que “o verdadeiro saber está em conhecer a própria ignorância”. Sócrates, por sua vez, valorizou a busca do conhecimento perante o Oráculo de Delfos: “eu sei que nada sei”.

Hoje, o culto da ignorância visa controlar os largos contingentes de imbecis, de maneira a
se obter o domínio das instituições políticas, com o propósito de manter vivo o fascismo
eterno. Para tanto, é fundamental o controle das mídias sociais e que a educação do povo
seja eliminada, em favor do adestramento para tarefas meramente básicas, sem a formação crítica e do livre pensamento. Os atuais aliados naturais do totalitarismo são as grandes empresas prestadoras de serviços na Internet, que se somam aos aliados tradicionais do fascismo, como os bancos, os latifúndios e as grandes empresas monopolísticas. Uns ganham poder político e, outros, poder econômico e nanceiro.

Com controle do poder, o fascismo eterno compra, degrada e perverte instituições que já
foram instrumentos do saber, como a imprensa, que se tornaram prostituídas.
Amalucados, cretinos, imbecis e aparvalhados ganharam espaço nos noticiários.
Jornalistas, escritores e advogados passaram a se vender por um prato de lentilhas, caindo
voluntariamente na vala comum da insciência. A cultura e o saber caram indefesos em nosso amargo presente. Tristes tempos estes que fazem o fascismo vitorioso!

DURVAL DE NORONHA GOYOS JR., Jurista, professor, escritor e historiador. Da
Academia de Letras de Portugal. Ex-presidente da União Brasileira de Escritores. Escreve
quinzenalmente neste espaço às quartas-feiras